39,90+39,90+27,00+37,00+49,90+76,00+25,00+17,00+22,00+56,00,
certa como dois e dois quatro, do retorno à drogaria, madame, ainda em outubro.
Mais corticoide, mais metrexato, mais
ocupress colírio, mais concor e mais torlós, só aqui, me lasco. Nunca fiz as contas de precisamente quanto
do meu breve salário é destinado aos malditos fármacos empenhados em melhorar
meu estado geral, é sempre igual, as
folhas caem no quintal, vou varrendo, vou varrendo, vou varrendo, vou varrendo,
tudo embaixo do glorioso tapete vermelho-sangue, rubra seiva de mim, rarará, a nobre
alcatifa do honradíssimo banco do brasileiro enforcado: sonhe, o BB realiza. Conservo a
cabeçuda esperança verde-mata, "mata
ela, mata!", rarará, de desencarnar do azul para o azul, sem dever dois reais
a Seu Ninguém, quem sabe. A senhora não se confundiu: dois dentistas. Um exclusivamente para
providenciar implantes de me extirpar as vísceras. Aliás, na fresta mais dócil e
pura de um pequeno dia, de repente, entenderei por que implante é tão caro.
Hoje não. A dentista cuida de escorar o caco que perde o prumo. Ainda ontem,
recebi uma notícia dramática, um açoite no lombo taludo: "aconselho você a
fazer outro implante, esse dente não se aguenta muito tempo.", pá!!, desse
jeito. Não achei o que vender em casa, tô partindo para as córneas, quero parar
de enxergar meus horizontes, a leitora, acaso, se interessa? Cheguei a pensar
em Ronaldo, rarará, parcelado, em duas vezes. Ronaldo não, nunca de never
more, rarará. Ronaldo, colégua, não tem dinheiro nas galáxias que pague. Pega
a doida de pedra se lembrando daquela música: errei sim, manchei o teu nome... Nome mais sujo que pau de
galinheiro... Manchei o meu nome, mas foste tu mesmo, mundo cruel, o culpado,
rarará... O fundo do poço tem mola. Na maior insegurança, um medo danado do
grave pecado da mentira, eu garanti, capital
letters: o fundo do poço tem mola, minha querida. Tudo, tudo passa. A
dentista é uma querida, muito querida. Tantos momentos cobrindo, remendando,
rebocando, resolvendo como pode, em horários inacreditáveis, coitada, os
problemas cascudos das minhas arcadas corticoidemente afetadas... Como foi que
examinei tanto o sorriso do meu umbigo, desconectada de todo, de todo, dessa
pessoa tão disponível, tão amável, tão querida? Argamassa por cima das chagas. "Quando uma pessoa chora um choro em
desatino, batendo pino, como quem vai arrebentar", é um impacto, uma
descarga, um safanão no centro da mosca da sua cara. Um braço imenso, forte,
içando a sua alma metida à gente, desencarcerando o fantasminha equivocado, lançando
seus destroços de humanidade ao convés do mesmíssimo barco. Cara, somos as
miçangas do colar em torno do pescoço do planeta. O cordão adorna, o cordão resgata, o cordão
estrangula. Qual é a sua escolha? Reescrevo: impossível fugir, é, será sempre o
mesmo barco. Ignoro o germe em questão, percebi, entretanto, claramente: não há,
entre os anestésicos acondicionados no armário da doutora, um que atue na raiz daquela
dor. Sou quase um irremediável caso de focinheira e manicômio, sei de cor. O
minuto de lucidez é para não julgar. Não ofender, não contundir, não esfolar
mais, os psicólogos, psiquiatras e afins multiplicam-se feito preás,
especialistas especializados em mexer nas tais perebas. Minha parte é acudir o
outro. Minha fatia é empatizar, consentir no pranto, respeitar o curso da
lágrima cheia de sal, de som, de sentimento. Oferecer café, cerveja ou um
cálice de vinho. Ensinar uns palavrões eficazes. Liberar meus ombros largos, meus
abraços reconhecidamente acolchoados, meus ouvidos acessíveis. Luar sem amor, amor sem se dar? Na dúvida, olhe em volta. Na dúvida, expanda os limites do corpo, da mente, do coração descompassado. Na dúvida, simplesmente, acolha.
Empatia é tudo. Tudo o que falta hoje em dia. Como parece ser caro colocar-se no lugar do outro!
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