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terça-feira, 26 de junho de 2012
Despeito
O café da manhã de cuscuz
com ovo cochicha o mote da historinha de hoje, bem no pé do meu ouvido, e
agorinha mesmo vocês vão entender por quê. Eu tive a sorte e a alegria de
conviver com duas extraordinárias professoras de Língua Portuguesa, isso no
Colégio Nossa Senhora do Carmo, lá pra 1930: Xênia e Zezé. Naquele tempo, o
ensino ainda não padecia do bombardeio voraz e inútil das modernidades psicopedagógicas, metodológicas, didático-paradidáticas e psicodélicas que aniquilam a sua ossada e
todos os seus sentidos, nessa nova era uma vez; era, na época, uma coisa totalmente
diferente, me lembro até hoje dos recursos mnemônicos, sim, meus amigos e
minhas amigas da Band, recursos mnemônicos aos quais sobrevivi sem quaisquer
traumas, os quais me impedem, graças a Deus, duzentos anos depois, de trocar 'ss'
por 'cedilha', 'g' por 'j', e o raio que o parta, jazendo a culpa disso tudo sobre os
ombros largos de Maria José, grande mestra, uma parede, sabida como ela só,
outra mulher que, ainda mocinha, tive a oportunidade de invejar. “Atanazar,
bocafuzar, fuzuê, fuzaca e mozarca lembram algazarra”, não é isso mesmo, Tia
Zezé? Tudo escrito com 'z'. Nas minhas aulas, atualmente, a memorização rola
solta, mas eu tenho muito medo de ir presa. Xênia, pela minha pessoa, fez muito
ou tudo, não sei bem... Xênia não me ensinou a gostar de ler, com ela aprendi a
gostar de escrever. Gosto que me enrosco. Mais uma companheira de viagem pra eu
invejar até morrer. O que ninguém sabia, mas vai saber pelas vias do meu bucho
furado, é do meu tremendo orgulho de reencontrá-la, colega de trabalho na ocasião, nos
meus primeiros dias de então Escola Técnica Federal de Pernambuco, fiquei tão
contente que chorei, e ela compreendeu, que me conhecia como a palma da mão de
giz. Quando me mudei para cabo Frio, Xênia acabara de assumir a direção de
ensino, imagino com que afinco e competência, apesar de estar passada da hora
de parar, uma aposentadoria adiada e adiada, para o bem de todos e felicidade
geral da comunidade. Como sinto falta dessa delicadeza, desse compromisso,
dessa inteligência, dessa generosidade...! Entrei na universidade só para
desaprender Português e ficar mais apaixonada pela língua do patrão, quem
diria, estranha é a vida... De cara, assumi a monitoria de Inglês... Para nunca
mais brincar de outra coisa. Voltando ao assunto sem sair dele, a assessoria do
prefeito de Cabo Frio – VIVER AQUI É MELHOR, anda meio desligada, sem sentir os
seus pés no chão. A propaganda do prefeito, alardeando os grandes, efetivos
investimentos na educação, vi ainda ontem na TV, vê-se de um tudo na TV, residindo o perigo em acreditar, a propaganda ostenta
criancinhas bem lindas, bem nutridas, calçadas e uniformizadas, todas elas
divertindo-se a valer, num amplo e asseado pátio de escola bem linda, sob o
vigilante olhar de tias e babás muito lindas e bem pagas, um troço
espetacular, irretocável, não fosse um detalhezinho sem importância: Um erro
cabeludo! Sabe por quê? Não digo qual, nem que a vaca tussa! Observem os
dizeres sobre os sorrisos dos protagonistas, ria, curta e compartilhe. Ou não.
Meu sobrinho Alexandre não
vale nada, e foi dele que roubei a versão gay de Gabriela, roubei porque achei
de uma criatividade, não sei o que tem veado para ser tão criativo, Humberto
Martins com um cu no queixo, kkkkkk,
postei no facebook, chama-se Gaybriela. Por falar nisso, acabo de me lembrar da
historinha que ainda não contei, minhas tergiversões são aquilo que me salva
das intempéries do cotidiano, pela graça divina. A Gabriela de Walcyr Carrasco
homenageia o centenário de Jorge Amado. Diz que é uma inspiração livre, o que
deve querer dizer que o autor faz o que quer com o texto do outro, como bem lhe
apraz, deve ser isso. De Jorge Amado li três livros apenas: Mar Morto, Capitães
da Areia e Os Pastores da Noite, gostando demais de todos, mas preferindo o
último, disparado. Ah, li Navegação de Cabotagem quase todo, desisti de
concluir não me ocorre agora por qual razão, preguiça, suponho, ou saí para
beber, naquele tempo eu enchia a lata sem constrangimento, mas me lembro de que
estava achando o negócio bem bacana, tenho essas esquisitices. Se eu, num mau
dia, revelar quantas leituras inacabadas fiz, meus alunos não me respeitam
nunca mais, aluno é alma sebosa, raça da pior categoria, quem não sabe, saiba.
Menos os meus adorados e adoráveis, “óbvio ululante”. Sei que Gabriela Cravo e
Canela tem pra mais de sessenta anos, é uma obra famosíssima, traduzida para
várias línguas e tal, mas não tenho a mínima loção da idade do personagem
central da trama. Sábado, por cima de toda moleza e febre, fui fazer a unha no
salão, sou testemunha de que salão de beleza melhora a mazela de qualquer
Amélia. Lá, minhas amigas e meus amigos da Record, não se falava em outra
coisa. Gabriela Paes está na boca do povo, coitada. Bom para ela. O comentário
inicial dizia respeito à idade, mas eu nem interferi, fiquei quieta, escutando.
Uma moça argumentou, com toda a certeza desse mundo, que Juliana está muito
velha para o papel, que a Gabriela de Jorge é uma menina. Eu de cá, só
espremendo o juízo, tentando me lembrar da cara de Gabriela Sônia Braga no
filme, um filme maravilhoso, só consegui me lembrar de que saí do cinema e
entrei na loja de disco para comprar a trilha sonora, que adquiri também em CD, isso
oitenta e seis anos mais tarde. “Casa de sombra, vida de monge, quanta cachaça
na minha doooor”... Quanta cachaça na minha dor... ‘A versão nova é livremente
inspirada no livro’, arrisquei, mas só eu ouvi. A moça é que estava
inspirada... E indignada. A moça vira a tal cena da transa de Nacib mais
Gabriela, na sexta-feira, Nacib comendo de Gabriela até o bagaço. “Que coisa horrorosa aquele peito de Juliana Paes,
parecia um ovo estrelado!”, essa a sua avaliação. Eu de cá, matutando se é
estrelado ou estralado, ou outra coisa, mas saquei a mensagem, deixei de lado.
Juliana Paes foi namorada do irmão de um amigo meu da escola, a gente conversou
muito sobre ela uma vez. Ele me contou o que eu intuía, que ela é uma mulher
muito legal, descolada, simples, simpática, o irmão dele não conseguiu segurar
a onda de ficar com ela, depois que ela começou a aparecer na mídia, o babaca
de carteirinha. Não acho ela linda não. E acho. Acho lindo como ela se expõe,
com aquele olhão de quer matar papai, de dente no quarador, em tudo quanto é canto, acho linda a autenticidade dela,
que ninguém paga suas contas, acho linda a entrega absoluta à gravidez,
engordando muito mais do que o recomendado, a devoção ao pequeno Pedro, que
ainda deve estar mamando, se duvidar. Vi uma entrevista com ela no programa de
Regina Casé, fiquei abismada, só dava ela sambando feito uma doida, balançando as
tetas enormes, “Pedro vai mamar o quanto quiser”, confirmava, entre sorrisos.
Ela deve ter perdido muito peso para interpretar Gabriela. Deve se acabar nas
massagens e drenagens e nos tratamentos de ‘reconstituição de beleza’. Vai ver esqueceu-se
de mexer no peito. Ou tem um implante de silicone já marcado para dois dias
depois do último capítulo da novela. Ou não. A impressão que me dá é a de que a
gente perdeu a referência, com o peito original de fábrica sob o sério risco de
extinção. O peito original, essa espécie envergonhada. A beleza não pôe mesa, gaiola bonita não dá comida a passarinho.
Jorge Amado viveu mais de cinquenta anos amigado com uma mulher feia, linda
para o seu olhar. A beleza esteve, está e estará nos olhos de quem a vê. De Zeinha
li três livros, de capa a capa, esperando sobrar um dinheirinho para comprar
mais: Anarquistas Graças a Deus, Um chapéu para viagem e A casa do Rio
Vermelho. Sou muito fã de Zélia Gattai, pela graça e leveza com que ela
imprimiu suas belas memórias no papel, para a posteridade, para o deleite
daquele que gosta e vive de recordar, como eu. Estaria Jorge satisfeito com o
resultado da livre inspiração em cartaz, com a escolha da protagonista? Estivesse entre os vivos, seria o caso de
contar com a preciosa ajuda de Chico Xavier, uma psicografia do próprio autor
esclareceria tudo. Confesso que já entrei na fase de não conseguir perder meio
capítulo, apesar da participação de Maitê Proença, tão insossa, a bichinha, ainda mais
contracenando com aquele gigante, a Laura Cardoso. Aposto meu baço, que os ovinhos fritos
de Juliana, Nhô Jorginho Amado do Brasil os aprovaria, maravilhado e estupefato,
de boca aberta, escorrendo água. Eu, hein?
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