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segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

O segundo sol

Uma saudade enorme come, deita e dorme no meu coração. Ainda bem que eu sei cantar, digníssimos leitores do meu respeito, ainda bem. Canto de morrer, de deturpar as cordas vocais, toda vida fui assim, gosto de música para escutar e para acompanhar no gogó da siriema, rarará, dois tons acima, esganiçada... Isso da saudade enorme é um forró forrado, danado danadim de bom, uma saudade enorme come, deita e dorme no meu coração, remédio indicado pra quem está errado é pedir perdão... Ontem, na boquinha da noite insensata, rarará, Ronaldo me flagrou foi no seio do chororô, maior vexame, cara. Ronaldo fica injuriado quando me surpreende derramando as rubras e vultosas pitangas, rarará, o macho adulto da espécie tem essa besteira, fala a verdade, madame, essa dificuldade ancestral com transbordamentos de qualquer ordem, tanto os pessoais, subjetivos, quanto os alheios, chega dá pena. Complicado administrar tais momentos Manoel Carlos em família, porque engasgo na hora, do susto de engolir ligeiro o sal das compotas, a lágrima empedra no miolo da laringe, balbucio equações primárias incompreensíveis, vou grunhindo nanicas notas de rodapé, rarará, uivando para a lua meus mais entrecortados e cristalinos esclarecimentos, os quais, by the way, meu doce homem da cor brasileira, obviululantemente, não entende, rarará, é desse jeito.
Todo aquele que, a essa altura da peleja com a poli, não faz a menor ideia do que se passa no espírito e na musculatura da blogueira mais famosa aqui de casa, faça à dona deste probo blog ursinhos carinhosos a gentileza: levante o traseiro daí, juntamente com o seu sebento acampamento, e troque imediatamente de freguesia, siga seu caminho na paz dos covardes uniformes e regulamentados, à espessa sombra da insensibilidade desumana, peregrina com o anjo mau que te escolta a carne e o nervo indiferentes, vai para o diabo que te carregue, árido irmão de alma vil, vai se queixar para o bispo, vai mesmo, e se puderes, não voltes. Não gasto mais uma tira de imbira da minha nada mole existência aventureira atrás de angariar um aplauso e uma lambida: o rabinho abanando, a simpatia e a consideração de quem quer que seja. Dane-se, meu negócio para o instante e sem demora é a liberdade dos afetos espontâneos, aquela querência recíproca desabalada, à superfície do lindo lago do amor, silvestre florzinha mística, miúda e branca, perolada, nasceu lá porque quis, ora, iluminada ao sol do novo velho mundo, e desprovida de entretantos, de estranhezas, de infantilidades, de ofensas bicudas, de percalços e de condições tão adversas, amém.
Minha reclusão provoca a dor de uma saudade, decerto. Doeu, deságuo, não tem jeito. Sabe aquela saudade roxa, blue e esverdeada, cintilante: um hematoma sorridente? Pronto. Cada mergulho no perene açude da saudade é um flash, o holofote queimando lenha nos becos escuros das cruas intimidades, um insight, um brusco entendimento de quem ela era e de quem vai, pouco a pouco, se tornando, sua mais firme, funda e fatal identidade. Saudade inconsolável dos que me amam sem renúncia, sem confronto, sem conversa fiada, sem sofrimento nenhum, amam a gorda escrevinhadeira e acabou-se, essa gente esplêndida, valente na coragem mansa de amar e revelar publicamente “Adriana, mulher, eu te amo, esqueça nunca não, eu te amo”, mobilizando céus e terras, um volume de luz, de vibração do e no bem, de energia limpa, positiva, que é como um alazão de fogo em movimento, galopando ao redor de mim, erguendo do chão o pó dos astros, das estrelas, a nuvem de pirilampos pousada leve na polpa de um profano véu de incertezas, temores e vulnerabilidades. Um cobertor de mais de um milhão de vagalumes. Meu aluno me conta que reza por minha recuperação toda calada santa madrugada, e não é porque pedi, que sou esse exemplar, fêmea ainda bastante envergonhada, Dona Adélia, o menino reza porque o menino quer. Meu amigo me garante de pés juntos que a minha dificuldade o reaproximou de Deus: “me lembrei de Deus, Adriana, bato papo com Ele à vontade, os cascos no sofá da sala, numa saliência que só vendo, e a culpa é toda sua”. Segunda vez já que a mãe da aluna telefona para me dar uma atenção, fofocar um pouquinho, “você deve se sentir tão sozinha, Adriana, muito ruim, eu imagino!”. De manhã, é o telefone piando, minha irmã Iêda, lógico, logo cedo atentando, perguntando se dormi, o que comi, o que não comi, se estou com azia, se tomo leite, como está Ronaldo meu cunhado querido nessa confusão toda se virando. Felipe não escapole para a cama sem me mandar um beijo face de boa noite, isso todo dia. Olhares tão ternos, palavras tão quentes e serenas, gestos tão nobres, o amor só procurando uma brecha, uma desculpa, para mostrar na cara de pau a cara. O amor cutuca, se importa. Não me resta alternativa, choro. Ungida do mais sublime, poderoso amor, choro. Ninguém pense que retornarei à ativa para calorosos embates, grandes participações, competições e conquistas, feitos espetaculares, tal e coisa, rarará, nada disso. Escolho as últimas posições do ranking, um conforto, uma cadeira de palha para a idade avançando, o sossego de quem vislumbra prioridades completamente prioritárias. Vou deixar o rio me levar para o lugar da paz da simplicidade: carinho e caridade, graça, riso, preguiiiiiça, essas tolas insignificâncias. Eu quero o silêncio das línguas cansadas. Eu quero a esperança de óculos e um filho de cuca legal. Meu filho, leitora, por que não? A maternidade, essa sim, é uma baita de uma honra.

2 comentários:

  1. Só quem é gente boa de verdade mobiliza esse amor todo envolta de si sem precisar mexer uma palha. A gente te segue por todos os cantos porque gosta de você. Adriana Guimarães só tem essa aqui :D

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  2. Lindo, como sempre, escrevinhadora!! Esse é o puro amor, o que vem sem cobranças e sem ninguém pedir. Assim seja na sua vida, sempre! bjs

    Mônica Athayde

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