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quinta-feira, 13 de março de 2014

A fada do dente

“Morrer é só não ser visto”. Ponto para a pessoa do Pessoa. Recebo um telefonema, vindo de lá, diretamente da batcaverna – a celula mater - uma moça boazinha que só, a moça me informando o dia e a hora da perícia médica, em Campos dos Goytacazes. Esclareci que não posso viajar, e nem é porque não quero conhecer a instituição, nada disso, “eu amo o longe e a miragem, amo os abismos, as torrentes, os desertos”... O problema é que o doutor não deixa mesmo, nem que a vaca tussa. A alternativa que gentilmente me oferecem é esperar. Devo ligar para remarcar a perícia quando estiver liberada para a viagem, noutras vãs palavras insensatas, completamente curada. Tenho um baú abarrotado de retalhos multicoloridos para cerzir a crônica definitiva a respeito disso, a senhora jamais duvide. Obviululantemente, declino o convite à contradança indignada “à sombra do mundo errado, murmuraste um protesto tímido”, posso agora não, passe mais tarde, há que minimamente resguardar-se, polimiosítica ‘inflamada’, rarará, e desmiolada. Do alto do manso, a contribuinte sem saúde reivindica, pois, um breve intervalo, café e dois dedos de paz na alma, se tem uma coisa inútil que incrustei na profundidade da pele, ao longo dessa minha doce vida besta, é aquela máxima não sei de quem, nem pretendo pesquisar, porque posso, não faço, Aldous Huxley ‘rings a bell’, acho que é citação dele: os mártires penetram na arena de mãos dadas, mas são sacrificados (ou será crucificados?) sozinhos. Bairrista atrevida, petulante, sem papas na língua, ratifico: em Pernambuco, uma dificuldade dessa fragrância, simplesmente, não existe, isso não acontece, palavra de quem foi meio filial e meio matriz, decerto. “A morte é a curva da estrada”, Fernando Pessoas. “Morrer é só não ser visto”.
Minha dentista confirmou a suspeita, dissipou-se uma camada das presas, fale aí a leal leitora dos meus esdrúxulos percalços, madame do céu, quando, em seus piores dias, a senhora imaginaria uma doidice assim? Alguma substância do tinhoso corroeu o meu sorriso, querendo, acredite. Fiquei tão impressionada com a novidade dando à praia, bem que eu já sentia uma intrusão, uma esquisitice, como se a gengiva, do nada, despertasse, virasse um organismo cheio de vontades, tudo túmido, rarará, sensível, me ardendo, o fio e a escovação produzindo uma areia de dente, uma farinha de esmalte, arre, égua! O capítulo mais interessante do tratamento odontológico é o preço módico, pela fé. Minha felicidade é a teima, a pirraça, uma confiança inabalável na plena recuperação das faculdades físicas e psicológicas, só penso em trabalhar de morrer, de cair o panamá, sei de alguém que não logrará escapar de pagar essa abrupta despesa, “barco perdido, bem carregado”, Dona Rita repetia, que Deus me ajude. E Deus ajuda, pereba. Deus ajuda. Ameaça: Deus. Covardia: Deus. Dor: Deus. Pavor: Deus. Solidão: Deus. Compaixão: Deus. Perdão: Deus. Transformação: Deus. Destino: Deus. Deus morde e assopra, caçoa, consola, Deus. Deus de mola. Deus demole e edifica o íntimo altar do mamulengo. Condenados à eternidade, lembremo-nos: o mafuá conta com excelsa Gerência, o time tem Diretoria.

2 comentários:

  1. Já te disse mas não custa reforçar, você é uma pessoa muito forte, mais forte que o exército dos Estados Unidos todo hahaha

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