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quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Abracadabra

"Vou apertar, mas não vou acender agora". Quem conta um conto, aumenta um ponto, atento ao momento da cobra fumar. Não pense que o cronista vive de brisa, costurando acasos ao seu capricho, ao seu bel-prazer, quando lhe dá na telha. A banda toca outro dobrado, vou esclarecer bem direitinho. De fato, o chamado é instantâneo, bate e fica, a gente sabe logo que emprenhou. O pulo do gato consiste mesmo é no encontro das águas, na sua premência em dar à luz, tão bonito isso, que vou repetir, dar à luz, a premência em dar à luz, coincidindo com a hora da pura semente romper-se em história. A gestação pode durar horas, dias, semanas, a vida inteira. Conheço pessoas que tencionam escrever faz oitocentos anos, acumulam lotes de motes, jamais entrando em trabalho de parto. Devem ser os casos mais complicados, para fórceps ou cesariana, multiplicadas por mil as chances do doloroso processo resultar em feto natimorto. Tantas esquizofrenias interpõem-se entre os atos de ver e escrever - pavor do erro, do julgamento, pavor de desapontar o outro e a si mesmo – desumanas as exigências sobre os ombros nus, os ombros suportam o mundo, mas são ombros de criança, criança suplica colo e aceitação. Um mínimo de condescendência para consigo, de  laissez-faire  e de cabeça de vento são fundamentais, não se pode forçar demais a natureza, entretanto.
Tenho tarefas importantes a realizar hoje, preciso preparar uma prova e uma aula. Não farei uma coisa, nem outra. Meus leitores são poucos e muito bons de coração, ninguém vai sair por aí badalando aos quatro cantos da escola, que eu me viro nos trinta, na base do improviso, contando com a experiência de que nem me lembro mais, minha memória é fogo. Hoje eu não digito uma prova nem para o Sumo Pontífice, estou pelas tampas com o desserviço do departamento de APOIO da instituição de ensino onde me arrasto, até o dia da bem-aventurada aposentadoria, não tarde, minha linda, que quero lhe usar, e o quanto antes. Semana que vem, vou pedir cópias de prova aos quarenta e seis do segundo tempo, só quero ver o bicho que vai dar. Ando doida por um revide. Meus meninos vão gostar é muito da brincadeira de adiar o exame, rá rá rá. Capricorniano é o cão, eu sou, e dobrada, feito tapioca. Agora é o seguinte: se existe uma coisa que me quebra, mesmo no lugar da solda, no país da delicadeza perdida, essa coisa é a gentil delicadeza, a virtude de curar todas as moléstias. “A delicadeza é a flor da humanidade.”
Um dia, minha irmã Dau, ainda menina, roubou uma flor do jardim de Dona Hermengarda, a vizinha lá de casa, para dar de presente à mainha, na mais singela demonstração de amor filial de que se tem notícia. A bichinha chegou na cozinha, o coração saindo pela boca, exultante pela proeza, ninguém a tinha flagrado no delito, os olhinhos apertados, rasos de afeto, estendeu a mãozinha, a rosa em flor, mainha fez foi virar Hulk. Eu não presenciei a cena, eu nem existia, na época, dizem as más línguas que mainha deu a braba, arrastou Dau pelo braço, Dona Hermengarda ficou chocada com a violência, tanto estardalhaço por causa de uma reles florzinha, a rosa de Hiroshima foi devidamente devolvida, acompanhada de um milhão de pedidos de desculpa. “Dona Hermengarda, por favor, a senhora me ajude. Eu não crio filho para se apoderar do que é dos outros, e sem pedir licença. Ela vai lhe pedir todas as desculpas que a senhora merece, vai lhe pedir essa flor, vai agradecer, só assim é que eu aceito o presente.” A pobrezinha da Dau chorou de morrer, passou a maior vergonha da vida, coitada. Aprendeu. A gente foi criada desse jeitinho ursinho carinhoso, pela graça divina. A minha mãe criou-se sem mãe, mas soube ser uma, com louvor. A minha mãe não alisou banca de escola, ela mesma e mesmo dizia, “não alisei banca de escola, mas sei ser educada e quero filhos educados.” Cresci fazendo concessões de todas as fragrâncias, acostumei-me a olhar para todos os lados da lei, “porque gado a gente marca, tange, ferra, engorda e mata, mas, com gente é diferente.”  Cresci pedindo desculpas até às pedras do chão, pelo meu excesso de peso. Cresci pedindo licença para caminhar ao sol. Cresci grata à humanidade, até pela bondade que nunca me fizeram. É berço. As palavrinhas mágicas vadeiam aonde vou, abrindo-me todas as portas, exceto as do departamento de APOIO ao docente, alguém deve ter enterrado uma cabeça de burro ali, o setor precisa ser exorcizado, com a máxima urgência.  A gestão é ditatorial, incompetente e causa um mal irreparável ao desenvolvimento da escola e do aluno.

5 comentários:

  1. Medalha de ouro em abigobalisse: Adriana Guimarães do Brasil!!!!!!

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  2. Hahay
    Parece que cutucaram a onça com um palito de dentes...
    Tia, toca horror nesse departamento.
    Tem gente que só funciona na base do terrorismo. kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk
    Vó Rita era foda! Vou morrer falando isso.
    Era a mais foda, a mais delicada, a mais educada e a mais linda.
    Bjim
    Manu

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    1. Concordo em gênero, número e grau, Manu... Mainha era foda demais!!

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  3. Faltou foi Mainha nesse tal departamento,né não???

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  4. Você também deveria comentar sobre a internet que não funciona, sobre a liberação do nosso único servidor técnico em audiovisual, sobre os professores que se dizem muito atarefado e não podem dar aulas, claro que o vencimento do professor sem doutorado é mínimo, portanto eles devem buscar uma melhora salarial, mas não devem fazer isto em detrimento das aulas que devem ser dadas. São tantas coisas que podem e devem ser melhoradas. Em busca da defesa ao setor, basta que os professores e todos os outros que utilizam o serviço de reprografia, possam ter acesso as regras estabelecidas a bastante tempo sobre o pedido de cópias, 03 (três) dias de antecedência para pedido de provas e 05 (cinco) dias para outros materiais.

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