Deve ser alienação da minha cabeça. Mainha e Painho,
ambos bem passados dos quarenta, brincando de médico, na maior inocência,
apostando tudo na infertilidade que os anos vão esculpindo, na casca e por
dentro - esterilidade advinda do avanço do tempo, o galope só é bom bem livre... da idade, rarará, a calda deu o ponto
certinho, virei ovinho de Páscoa, rarará, recolhida à escuridão do ventre, trancafiei-me na masmorra uterina, ‘daqui
não saio, daqui ninguém me tira’, só botei as manguinhas de fora na hora
combinada, exatos nove meses depois da saliência,
nove meses, de abril a janeiro, faça as contas. Nasci dia quatorze, para ser cabra da peste, e sem um pingo de juízo,
rarará, capricorniana desmiolada do sal da terra, porém libriana avoada, leviana para quem olha, puro azar, culpa do ascendente de vento, já pensou? É fogo. Deve ser alienação
da minha cabeça, preciso perguntar aos universitários, lá do trabalho, se eles
também padecem do cacoete: eu tenho o maior tesão numas palavras deliciosas da
gente! Em contrapartida, às vezes, perco o bonde e a esperança, no vácuo,
fitando pilhas de nada adiante, rarará, escarafunchando o despenhadeiro da
memória, catando similaridades parciais, sinônimos imperfeitos até, dou um
quarto ao diabo para dar a volta onde o diabo perdeu as botas, quero escapar de
usar, no textículo de minha autoria, conta e risco, rarará, aquele termo
enviesado do qual jamais consegui me afeiçoar na vida. Coisa de maluco isso. Capaz
de Flima gostar de conversar comigo a respeito. F. Lima é Fábio Lima, uma
sumidade do Instituto Federal Fluminense,
no que se refere, rarará, à Língua Portuguesa. Fleuma, por exemplo, é linda demais, no longette passeio formal branco-gelo, no caimento, no garbo, na
sonoridade, no seu mais preciso significado, adoro fleuma.
Fleuma soa mais ou menos como Flima,
deve ser por isso mesmo que me lembrei do colega.
Desde menina miúda, gosto de escrever mil vezes as
palavras que me conquistam. À mão, claro. Rabisco e leio - sussurando,
cantarolando, aos berros, fazendo careta – vou mudando o tom da voz,
completamente pancada das ideias,
rarará, preparada para adentrar, a qualquer instante, o pórtico de um hospício
de grife e instalar-me, de mala e cuia, em um de seus aprazíveis quartinhos vip. Apego, afago, afeto, alma, aragem, brisa, bruma, cão, cinema, cálido, casulo, clamor, crisálida,
comunhão, duelo, estio, festa, flor, filho, fibra, fugaz, grito, harpa, ímã, ilha, ilusão,
jardim, jangada, justiça, linho, ladeira, luar, liberdade, mãe, mulher, manhã, maçã, multidão,
nuvem, ninho, outono, pão, prazer, pérola, pêssego, poema, povo, pássaro, poente, quase, quimera, rã,
ruído, selva, saveiro, sonho, saudade, toada, telha, vinho, voragem, vontade, xale, xícara,
zinco, uníssono, universo, utopia, união. Brochante é listar aqueles vocábulos mais
fraquinhos de espírito e de feição. Colabora? Abutre, abuso, acinte, açoite, assassino,
bomba, bazuca, crime, canhão, conchavo, coronhada, carniça, derrame, defunto, esfolar, ferida, grotesco, gangrena, hecatombe,
hematoma, hediondo, humilhação, impunidade, jugo, larápio, ladrão, morte, opressão, podre, tanque, tortura, trombose, tripa, truculência, supurar, sucumbir, sangue, servidão, segregação, saturado. Duvido que a senhora esteja ocupada, acabe com
essa dissimulação sem graça, pare de fazer a linha operária padrão, “pensando
ter amor nesse momento, desesperada, você tenta até o fim”, rarará, pelo
amor de Santa Rita dos Impossíveis! Piada, né? Acorde para a realidade, a tropa de choque dos
fatos, madame! Seu patrão, mais milionário e mais filho da puta a cada primavera de praga de espúria criatura, desdenha
das escoriações da sua dignidade, escarra nos seus mais singelos e sinceros nobres sentimentos, fala a verdade! A senhora, pobre de Jobre, rarará, se estropiando
toda aí nesse estabelecimento, abrace o pau de dar em doido, envolva a cara num
pano, ou não, e vamos para a arena da rua! Luto atuante é luta! Perturbe a paz e exija o troco. Revelação. Resolução. Revolução, plácida senhora.
Depois de uma enxurrada de palavras não vou me conter em falar sobre uma bem simples mas que nunca vou esquecer: "sinceramente". Eu aprendi sobre sua origem enquanto lia "O Símbolo Perdido" de Dan Brown, 2 anos atrás. O livro conta que na Roma antiga, escultures desonestos usavam cera para cobrir as imperfeições nas suas estátuas esculpidas em mármore que competiam em concursos de arte. A tática foi amplamente utilizada visto que o mármore branco não mostrava muita diferença à cor da cera. Num dado momento, a técnica chegou aos ouvidos de um escultor que se recusou a utiliza-la e ainda sugeriu a comissão que realizava as competições, que passassem uma tocha por todas as estátuas. Todas as estátuas caíram porque a cera tapava fraturas no mármore. Todas exceto a dele. Ele foi o único que falou a verdade, sua estátua era "sem cera", em italiano arcaico "sine cera", que virou "sincera". Sinceramente, sensacional né?
ResponderExcluirPutz!! Que massa!!
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