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quinta-feira, 17 de outubro de 2013

À paz

A minha alegria atravessou o mar e ancorou na passarela. Fez um desembarque fascinante no maior show da Terra: o grêmio recreativo escola de samba carnavalesco bloquinho de notas de inutilidade pública FUCHIQUE, rarará, dos meus olhos a menina. Em edição extraordinária, hoje é quinta-feira!, o plantão do blog tem a enorme satisfação de comunicar aos diletos leitores que o menino dark recuperou o telefone e o viço.Vão-se os anéis de fumo, ficam-me os dedos estarrecidos. De todo contratempo resta uma fatia de agridoce lição, uma reflexão atônita para a gente aprender a tocar o barquinho furado da vida: tarefinha besta torrão de açúcar, travoso indigesto dever de casa - um parafuso solto de ensinamento, querendo ou não, violão, no coração de melão do futuro do homem jovem, sempre fica. Bater o martelo encerrando o assunto? Uma precipitação, madame. Gente é como a gente, não nasceu para ser parida e esquecida. Recebi muitos cumprimentos superlativos lança-perfume confete e serpentina, rarará, pela historinha anterior. Duvido eu cair nessa esparrela. Acolho, modestamente, as gentis palavras, sou-lhes muitíssimo grata, apesar dos pezinhos roliços bem assentados no chão de barro batido da mais pura verdade, capricorniana elemento terra é fogo: menos, fechado? Vamos combinar, rapaziada sangue bom desocupada: no frigir dos ovos, angu demais, mirrado recheio. Tudo somado, trata-se de mero descomedimento. Maiúsculo exagero.
Ainda ontem, à bem-vinda hora do almoço, conversava com Iracema e Bianca, duas queridas colegas de trabalho e de vadiagem, rarará, sobre este meu diário de bordo cotidianamente acessado, sabe-se lá por quais fulanos, beltranos e sicranos, nas bisonhas espeluncas do caminho. Indiscutivelmente, dei a fuça e o verbo à tapa. E fiz uma legião de seguidores. Estabeleceram-se, com o respeitável público, vínculos sagazes de simpatia quase amor, assim como estrangulamentos vertendo deboche, repúdio e asco. Seja por profunda identificação interpretativa – sintonia moral, intelectual, social, emocional e afetiva - apresentemos a questão dessa maneira, seja por aguda distonia - discordâncias íntimas, viscerais, seja por antipatia funda, rancor augusto beirando as raias da loucura, o fato é que constataram que escrevo porque sei fazê-lo. Sigo altiva e atávica, vou riscando a areia virgem, abrindo sulcos de onde escorre o sumo dos relatos. Com a lâmina afiada das garrinhas pregueadas e artríticas dos tataravós adorados – um povo meigo e valente - rasgo o neutro solo inviolado. I couldn't care less... Escrevo de improviso, desleixada, blusa desabotoada, aberta às flores e às armas. Sem subterfúgios. Sem mel e sem chupeta. Sem planejamento. Sem censura. Escrevo sobre o que a vista alcança e a memória escoa. Escrevo sobre o que o compassivo coração, de cara, na lata, aprova ou condena. Quando condena, a senhora reparou, é entre dentes. Sorrindo largo, depois.
“Nunca imaginei que você tivesse tanto peito”. Pérola de Robson, um sujeito cheio de compromissos, certamente sem tempo para uma investigação mais criteriosa das medidas da minha caixa torácica, rarará. Ocorre que a curva perigosa dos cinquenta, querido amigo, precisa nos trazer alguma coisa além de dores reumáticas. Acumular aniversários é um santo remédio para os ressentimentos e as suscetibilidades, pode confiar. Os temores arrefecem, as angústias atrofiam-se, as mágoas encolhem, as picuinhas liquefazem-se. A pessoa se aproxima do próprio eixo, redesenha escolhas, define novas prioridades. Deita a cabeça no travesseiro, impressionada com a órbita de um mal entendido hiperbólico, súbito perdendo o gás, o contorno, sumindo na madrugada, poeira cósmica, infinitamente pequeno. Ninguém tem que gostar do cidadão, se não deseja, se não consegue. Jesus Cristo, em algumas rodas, sequer é conhecido, que dirá amado. O amor pode esperar milênios... no ar. Inaugurado o último trajeto, meu chapa, daqui para a imortalidade, apesar de todos os pesares, interessa mais estar de bem com o companheiro de viagem. De repente, conquistei a minha paz. Por mais extravagantes, estapafúrdios mesmo, me pareçam os acontecimentos, nunca mais hei de perdê-la. 

2 comentários:

  1. Não há coisa melhor que a paz da consciência, essa ninguém tira. O resto a gente ignora, eu ignoro também, você sabe hahahaah.
    Essa crônica me faz lembrar um dos poemas mais lindos que já li, "simpatia é quase amor" de Casimiro de Abreu, coisa fina! Um pedacinho...

    "Simpatia [...] São duas almas bem gêmeas
    Que riem no mesmo riso,
    Que choram nos mesmos ais;
    São vozes de dois amantes,
    Duas liras semelhantes,
    Ou dois poemas iguais."

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    1. 'Simpatia é quase amor' é também um inebriante bloco de frevo do meu glorioso Recife... Eita, saudade cheia de vazio...

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