Pesquisar este blog

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Ai de mim, Copacabana!

Sol malandrinho, sem mover a palha. O dia mal clareou, o galo do terreiro adjacente sequer abriu o bico, coitadinho, na madorna, cochilando, sonhando um farelo de sonho, raspinha de quimera dourada, fantasiando loucuuuras, rarará, com sua doce e guapa garnizé adorada, decerto, Ronaldo já controlando os tradicionalmente titubeantes passos da minha hesitante pessoa, está direito isso? Categoria para gostar de dar as ordens é marido, a senhora concorda? Leonino então, cruzencredo! Helena, mulher, nem procure saber como toca a banda, não vale um vintém da pena. Vá decretar na Central de Arquivamento, chefinho, rarará! Vá pela sombra, coração! Vade retro, entojado! Farei as compras, sim senhor, meu coronel, sossegue a periquita! Só que tem um detalhe, o seguinte: ouvido de mercador, larita banana frita, vou na hora que bem entender. Uma semana sem comida, na minha humilde residência, é um santo remédio para a família carga pesada. Ademais, quem manda em mim não nasceu, prefere que eu desenhe? Essa pentelhice só pode ser inveja do meu merecido descanso: férias esquálidas, mixurucas, paródia medíocre que nem dá para o gasto.
Ronaldo é um anjinho de candura, sério mesmo. Ele é carioca, ele é carioca, basta o jeitinho, rarará. Aposto que a senhora ainda não prestou atenção nas propagandas da Itaipava, cerveja carioquíssima. Faz tantas eras que não saboreio uma loura véu de noiva, tiritando no fundo do pote, nem posso julgar a supracitada, dizem que é leve, gostosa, pode ser. Sei que eles vendem o peixe direitinho na TV. São várias situações. Tem aquela do quiosque na beira da praia, o casal pede uma cerveja, chega o Bruno Gagliasso, Bruno Gagliasso vai embora, carregando a garrafa, o rapaz pergunta se a moça viu o ator, a moça faz aquela cara de paisagem, dispara: “quem é? que ator? nem reparei”... Ignorar artista famoso em beira de praia: 100% carioca. Carioca feito a Itaipava. Tem a outra, a dos amigos conversando na porta do bar, chega um sujeito, um dos caras faz uma festa danada, cumprimenta, aperta a mão, tapinha no ombro, tal e coisa, bate um papo porreta, o sujeito vai embora, o amigo pergunta: “quem é esse?” O cara responde assim: “sei lá! nunca vi mais gordo”... Fazer a social, na maior intimidade, com uma alma penada que você não conhece: 100% carioca. Carioca feito a Itaipava. Na minha modesta opinião nordestina, entretanto, a melhor da série é a do cara passeando no calçadão. Essa é digna de prêmio, sinto na pele. O cara encontra um amigo, aquela alegria, “que saudade tua!”, isso e aquilo, marca de visitar o amigo na manhã seguinte: “vou na tua casa, me espera!”. Três metros adiante, o cara encontra outro amigo, o mesmo estardalhaço, “quanta saudade, meu camarada!”, uma lengalenga parecida, o cordial convite, na lata, em cima do outro compromisso: “tô te esperando lá em casa amanhã de manhã! fechou! olha lá, hein?” . Essa é extraordinária! Marcar encontros concomitantes, reuniões paralelas que florescem e fenecem no âmbito da interlocução de cortiça, da prosa fiada: 100% carioca: Itaipava. O formidável da história toda é que o Rio é um território poroso, arejado, onde a dor não tem razão, as contusões não vigoram, fluidas com pedigree, os cariocas tão de boa, fora do prazo, sapateando no toró - maceteados, descolados – compreendem-se, defendem-se, relevam, ninguém dá pano para blazer esporte fino, menos ainda para mágoas e melindres.  
Satanás é os pés da besta para juntar França e Bahia, dessemelhantes continentes. Minha psicoterapeuta é da gema, nascida e criada na encosta do Corcovado, as sessões são os naufrágios e os resgates ensolarados, push and pull, trazem-me à tona, sal na boca e no olhar marejado, uma cena de cinema, a senhora avalie. Meu fundamento é custoso porque é sertanejo, madame, meu passado é jagunço, maciço, solo rachado que me condena. Nordestino flutua menos que mergulha, agita-se no limo espesso do açude de si próprio. Absolve-se pelo corte, o buraco, a imensa sutura, a cicatriz: precisa afundar, explorar o abismo, tatear as entranhas do poço, agarrar o cordão partido, amarrar as tiras poídas, reatar vínculos tão esgarçados, nós cegos a romper-se outra vez, outra e mais outra, como se um grande e intenso relacionamento, tão verdadeiro, tão cúmplice, tão repleto de graça e beleza, jamais houvesse acontecido, deixado um resíduo bom, um ponto de cruz, um símbolo sagrado, na parede atrofiada da memória. Um nó cego, subitamente lasso, a romper-se com o sopro mais delicado. Não. Comi todos os brioches que o diabo amassou. Todas as perdas irrecuperáveis são minhas. Fiz das tripas oração. Para quê? Desperdício de luz. Batalha vã. Inútil sofrimento. Não imagine que te quero mal, apenas não te quero mais. Cansei de ilusões, minha irmã. Você que esforçou-se tanto para desamar, deve ter conseguido, a gente vive como pode. Fique em paz, longe do meu abrigo. Pá de cal. The greatest thing you’ll ever learn is just to love and be loved in return. Recife borbulha de outros amores.

Um comentário: